terça-feira, 22 de julho de 2008

Capítulo 1 - Bec

Eu e a Nicole, Nick se preferir, nos conhecemos ainda pequenas. Meus pais e a mãe dela eram amigos, eu vivia na casa dela e ela na minha. Quando eu tinha cinco anos meus pais morreram em um acidente de carro e foi a mãe dela quem ajudou minha avó a cuidar de mim e das minhas três irmãs: Júlia, Sofia e Fabiana.
Nick e eu estávamos sempre juntas. Ela era minha melhor amiga, era a única que me conhecia de verdade. Talvez mais até do que minhas irmãs. A gente não se desgrudava um minuto. Fosse na escola ou em qualquer outro lugar onde uma estava, a outra estava também. Por esse motivo, quando ficamos um pouco maiores, os colegas de escola passaram a fazer piadinhas do tipo que a Lilá fazia. Por um tempo isso me incomodou um bocado, até que resolvi não dar mais atenção. Funcionou pra mim, mas a Nick não agüentava mais.

“Eu tenho que fazer alguma coisa, Bec. Hoje ela te empurrou, e amanhã? Eu juro que mato ela se encostar mais um dedo em você”.

Ela cuidava de mim como minhas irmãs cuidavam. Era assim que ela me via. E era assim que eu a via também. Ou pelo menos pensava que era.

“Deixa pra lá Nick. Eu estou bem. Ela não empurrou tão forte, só cai porque sou menor”.

“Exatamente. Olha o seu tamanho e olha o tamanho dela. É covardia. Ou não percebeu que comigo ela não se mete a besta?”.

“Claro que percebi. Mas bater nela não vai resolver o problema. As piadinhas vão continuar, e ai vai fazer o que? Bater no colégio inteiro?”.

“Bateria se fosse preciso. Mas tem outro jeito”.

“Sério?”.

Fiquei interessada, afinal, era uma droga agüentar todo mundo olhar atravessado pra nós duas e eu sabia o quanto aquilo a chateava.

“Não se preocupe. Amanhã na hora do intervalo vou dar um jeito nisso. Confia em mim?”.

“Você sabe que sim”.

No dia seguinte Nick cumpriu o que prometeu.

Ela saiu da sala antes de mim pro intervalo. Disse que cumpriria o que tinha dito. Deixei ela ir e fui para o pátio, sentei num canto quieto e fiquei lá. Claro que minha paz não durou muito, logo Lilá e seu bando estavam lá.

“Sozinha de novo, Bec?” Ela debochou.

“Vê se não me enche” Respondi e virei o rosto.

“Ou o que garota? Vai chamar a namoradinha? Olha, acho que ela não vem não, viu?” Falou sarcástica.

Voltei a olhar para Lilá. Não entendi o que ela quis dizer, fiquei preocupada.

“O que você fez com a Nick? Cadê ela?” Já estava de pé, encarando o mostro a minha frente.

“Bom, eu não fiz nada. Mas pode apostar que o Pedro está dando um belo trato nela...” Ela e as outras começaram a rir.

“Cala essa boca” Gritei com raiva.

Lilá parou de rir na hora, me olhou nervosa. Só me lembro do soco que acertou em meu olho. Fiquei caída ali, levando chutes e pontapés até a inspetora aparecer e a Nick não vir me salvar.
Fui levada para a enfermaria e Lilá para a diretoria. Mais tarde naquele dia fiquei sabendo que ela e o resto da gangue tinham levado suspensão por uma semana.
A inspetora era amiga da minha irmã mais velha e deixou que ficasse o resto do dia na enfermaria. Passou um bom tempo lá conversando comigo.

“O que foi que aconteceu, Bec?” Raquel perguntou.

“Eu gritei com a Lilá, e ela não gostou” Respondi mal humorada, com o rosto virado para o lado contrário.

“Por que gritou com ela? Estava te aborrecendo outra vez?”.

“É a única coisa que aquela idiota sabe fazer, não é?”.

“E onde estava a Nick enquanto isso?”.

Aquela era a mesma pergunta que me fazia: onde Nick estava enquanto eu apanhava como um animal?

“Não sei, ela saiu sem mim da sala”.

“Bom, ela já deve ter voltado. Quer que eu vá chamá-la?”.

“Não. Pode chamar a Fabi pra mim?”.

“Você e a Nick brigaram?”.

“Não, Quel. Ainda não”.

Mas naquele momento eu queria brigar, gritar, xingar, saber onde ela tinha se metido. E o que mais me angustiava: se era verdade o que Lilá tinha dito, o que ela estava fazendo com o Pedro?
A inspetora saiu pra chamar a única irmã que ainda estudava naquele colégio comigo. Fabiana chegou assustada, Raquel veio com ela.

“Como você está?” Fabiana perguntou.

“Dolorida” Choraminguei.

“Quer que ligue pra Ju?”.

“Não. Não quero que ela me veja desse jeito”.

Não queria que minha irmã mais velha me visse toda surrada. Meu orgulho estava bastante ferido naquele momento.

“Deixe, Fabi. Eu fico com ela até dar o horário, só faltam duas aulas. Não se preocupe”.

“Está bem. Eu vou voltar pra sala então. Qualquer coisa é só me chamar”.

Fabiana saiu e eu fiquei lá, deitada naquela maca. Minha cabeça a mil por hora.

segunda-feira, 21 de julho de 2008

Prólogo


É sempre a mesma coisa. A gente nunca sabe quando foi que começou. Só sabe que quando percebe, já é tarde demais, e que por mais que queira, não tem mais volta.

“Não Nick. Não vale a pena”.

Uma frase. Apenas uma frase foi o suficiente. Talvez se não tivesse dito, se tivesse apenas deixado Nick bater em Lilá quando quis... Talvez as coisas teriam sido diferentes. Mas eu falei e a Nick me ouviu. E pensar que tudo começou naquela manhã...

Na hora do intervalo, estava sentada lendo um livro no pátio enquanto Nick comprava alguma coisa pra gente comer. De repente senti um esbarrão no meu ombro e meu livro caiu no chão. Era Lilá, a valentona da escola com o bando dela a tira colo. Como não queria arrumar confusão, mesmo porque, com doze anos eu tinha o físico de uma criança de dez, não falei nada e abaixei pra pegar o livro. Quando me levantei, ela continuava no mesmo lugar.

“Hei, Rebeca, onde está sua namoradinha?”.

Fingi não ouvir e virei pra sair de lá. A garota me empurrou e eu cai. Foi quando a vi: a ruiva de quase 1,50m, vindo pra cima da Lilá parecendo um furacão.

“Deixe ela em paz”.

Nick a agarrou pelo colarinho da camiseta, e se eu não tivesse impedido, a coisa teria ficado feia rapidinho.

“Não Nick. Não vale a pena”.

E foi então que comecei a perder o controle.